Parar de Fumar – O Guia Absolutamente Completo para largar o cigarro!

“Parar de fumar é fácil. Sei muito bem do que se trata. Já parei mais de 50 vezes.” Frase atribuída ao famoso escritor Samuel Langhorne, mais conhecido pelo seu pseudônimo, Mark Twain. Publicou obras-primas como “As Aventuras de Tom Sawyer” e “O Príncipe e o Mendigo”.

Por que parar de fumar cigarro é tão difícil? Por que, mesmo sabendo de todos os malefícios, as pessoas insistem em fazer uso do cigarro? Por que sexo é tão bom? E aquele Big Mac com batatas fritas do Mc Donald’s, o cheiro de churrasco quando entramos na churrascaria, de bolo de chocolate no forno aos domingos da casa da vovó? Por que não fomos extintos durante o processo evolutivo?

Por mais desconexas que pareçam estas perguntas, digo que elas têm fundamento. Nosso funcionamento é muito influenciado pelo Sistema de Recompensa, localizado no cérebro. Trata-se de um conjunto de áreas que se comunicam entre si e enviam sinais de prazer.

Vou lhe contar um segredo: a arma mais importante para se ter sucesso em parar de fumar, além da determinação, é a informação. Portanto, venha comigo! Prometo que não lhe farei, durante a leitura deste texto, precisar de fumar um cigarrinho para manter a concentração e ficar acordado.

Aposto contigo que seu interesse será mantido à medida em que prossegue na leitura!

Parar de Fumar e o Sistema de Recompensa: o modelo do rato

Parar e fumar. Rato de Brinquedo.

[Em 1953, dois cientistas, Olms e Milner, realizaram um dos experimentos mais sensacionais da neurociência. Inseriram um eletrodo na cabeça de ratos e verificaram, estarrecidos, que os ratos apertavam repetidamente uma alavanca que ativava o circuito. Tal circuito enviava um sinal elétrico para a região hoje conhecida como “Sistema de Recompensa”.

A sensação de ter o Sistema de Recompensa ativado era tão boa que os ratos se esqueceram de suas funções básicas: comer, dormir e beber água. O desfecho não podia ser mais trágico: morriam, esgotados, de prazer!

Apesar de ter sido o responsável pela morte dos ratinhos, a ativação do Sistema de Recompensa é vital e responsável pela sobrevivência dos animais. O ser humano necessita desempenhar funções estritamente necessárias à sua sobrevivência: comer, beber, transar, dormir, urinar e… fumar!

Opa, este último NÃO é necessário à sobrevivência. Pelo contrário, é deletério! Causa danos (e você sabe disso!)!

O processo evolutivo selecionou aqueles capazes de melhor desempenhar estas funções vitais. Logo, justifica-se porque, para a gente, é tão prazeroso se alimentar, ter uma relação sexual, beber água quando com sede: o envio de um sinal elétrico, de uma forma natural, que ativa o Sistema de Recompensa com intensidades variáveis.

O experimento dos ratos ativou este sistema com tanta intensidade que as funções vitais não se tornaram mais tão importantes para eles.

Com o uso de cigarro e outras drogas, isto não é muito diferente. A ativação, principalmente nos primeiros usos, dá-se com tanta intensidade, que o fumante busca sentir este prazer do primeiro uso a cada tragada seguinte.

Parar de Fumar: O Grande Vilão é a NICOTINA!

Amoníaco, arsênio, benzopireno, butano, dietilnitrosamina, fenol, formol, naftalina, níquel, pireno, polônio, metanol, alcatrão, acetona, acetaldeído e… NICOTINA! Ufa! E isso porque só citei algumas…

São mais de 5000 substâncias presentes no cigarro. O pior: nenhuma dessas substâncias causa benefícios ao organismo do fumante. É tudo prejudicial! Substâncias cancerígenas, substâncias tóxicas prejudiciais a quase TODOS os órgãos do corpo e… NICOTINA!

O grande vilão para parar de fumar, responsável pelo vício, é a nicotina. Em menos de 10 segundos, a nicotina consegue atravessar todo o corpo e ultrapassar a barreira hematoencefálica, isto é, chegar ao cérebro. Lá, ela atua direta ou indiretamente no cérebro para estimular o Sistema de Recompensa.

Essa rapidez de efeito se compara à cocaína e ao crack!

Lembre-se do experimento do rato! Rapidamente, a nicotina atinge o Sistema de Recompensa! Como uma analogia ao experimento, podemos dizer que seria como se apertássemos a alavanca a cada tragada!

Uau! Maravilha! Não precisamos de mais nada! O prazer experimentado pelo hábito de fumar cigarro cria um paraíso bioquímico no Sistema Nervoso Central do fumante…

O fenômeno da tolerância

Cigarros e tolerância

Negativo! À medida em que o hábito de fumar avança, passa a imperar o fenômeno da tolerância.

Tolerância: necessidade de doses cada vez maiores de nicotina a fim de alcançar os efeitos. Em outras palavras, significa dizer que o fumante, após um tempo, passa a sentir menos os efeitos prazerosos ao fumar a mesma quantidade de cigarro.

Ou seja, se antes um cigarro lhe deixava relaxado e aumentava sua concentração por um tempo mais prolongado, hoje você tem um gasto financeiro maior, uma vez que precisa de mais cigarros para atingir este objetivo.

A necessidade do aumento da frequência de cigarros não vem apenas com o fenômeno da tolerância. Existe outro fenômeno fisiológico, terror daqueles que desejam parar de fumar…

A síndrome de abstinência: por que é tão difícil abandonar o vício e parar de fumar?

Você acende um cigarro e, com apenas duas tragadas, já é possível:

  • ficar alerta
  • sentir prazer
  • sensação de bem-estar
  • modular o apetite
  • sensação de alívio do estresse
  • ficar mais concentrado

É natural pensar que o cigarro atua ativamente no nosso cérebro e causa estes efeitos positivos. Na realidade, após cerca de uma hora sem o uso de cigarro, o efeito ativador da nicotina se dissipa, sendo necessário fumar novo cigarro.

Diariamente, você que fuma sente o efeito da síndrome da abstinência! Até porque, em uma noite de sono, virtualmente, não há mais nicotina no cérebro ao acordar. Você se sente estranho, com dificuldade de concentração, sonolento durante o dia, irritado, ansioso…

O que fazer? Fumar um cigarro? É o que a maioria das pessoas faz! Após as primeiras tragadas, o alívio destas sensações se dá pelo alívio da abstinência do cigarro. Sim, estes são sintomas de abstinência do cigarro…

Podemos definir síndrome de abstinência como um conjunto de reações psíquicas e fisiológicas sentidas por aqueles que dependem quimica ou psiquicamente de alguma coisa.

Quando você abandona o vício do cigarro, ocorre um remodelamento dos receptores.

Opa! O que são receptores? Entenda os receptores como uma fechadura, sendo que a chave é a nicotina. A nicotina abre a fechadura liberando as substâncias necessárias para a transmissão dos sinais, como o sinal de prazer.

Se você parar de fumar de fato, a densidade de receptores que havia aumentado ao longo da carreira de tabagismo começará a diminuir. A síndrome de abstinência atinge o auge na primeira semana.

Boa notícia: em cerca de um mês depois do último cigarro, você recuperará a sensação de bem-estar. Termina a sensação de abstinência.  Após isso, não existirá mais dependência química da nicotina!

Você reparará que se sentirá mais leve, mais disposto, com o paladar melhorado, sem tosses ou pigarros, sem congestão dos seios nasais.

E o melhor: não mais intoxicará seu filho, sua esposa, ou todo aquele que convive perto de você e se torna fumante passivo. Não tenho dúvida de que ficarão mais do que felizes e compartilharão contigo a alegria da sua vitória.

Recapitulando…

A dificuldade em parar de fumar se dá, de forma simplificada, por três motivos:

  1. efeitos positivos da nicotina
  2. abstinência
  3. comportamento aprendido associado ao cigarro

Parar de fumar: a última barreira

A síndrome de abstinência não é toda a história da dependência. Esta passa e os fumantes recaem por outro motivo: estresse desencadeia vontade de fumar, refeição, cerveja, cafezinho, tédio, uma gama de situações que foram associadas ao tabagismo ao longo de algumas décadas de vício. O fumante tragou milhares de vezes e, quando se vê novamente naquela situação, tem vontade de fumar meses depois do último cigarro.

O hábito de fumar, assim como outros comportamentos que devem ser reforçados, deixa uma marca importante nos centros de MEMÓRIA.

Quando está com tédio, depois de uma refeição, depois de tomar um café, quando está triste, o cérebro responde de um modo específico com ativação de regiões límbicas, que são importantes para a memória e as emoções.

É a região límbica a responsável, por exemplo, pela memória “gostosa” que certos cheiros nos causam, tais como o cheiro de bolo da padaria, que te faz lembrar daquele bolo de chocolate da casa da vovó, que você associa com o quão bom, na sua infância, era passar o feriado brincando com seus primos sem se preocupar em pagar suas contas…

Também é responsável pela relação com o cheiro do cigarro e a lembrança que acarreta ao fumante.

No tabagismo, a repetição desenfreada do consumo de cigarro deixa uma marca duradoura no funcionamento do cérebro. Tipicamente, as recaídas ocorrem quando o fumante está em abstinência, está estressado, irritado ou triste. Este é o principal desafio que você terá para parar de fumar de uma vez por todas.

O melhor tratamento para parar de fumar

Mudanças no comportamento ajudam a parar de fumar

Não sei se você já ouviu falar no TED

Não é aquele filme do ursinho com Mark Wahlberg não!

O TED é uma série de conferências sem fins lucrativos destinadas à disseminação de ideias inovadoras. São palestras com o limite máximo de 16 minutos com assuntos dos mais variados.

Em uma destas palestras, é posta a técnica do Mindfulness, que, em português, significa atenção plena. O psiquiatra da Universidade de Yale, especialista em dependência química, Judson Brewer, esclarece, de uma forma simples e didática, como funciona o método.

Assista ao vídeo com legendas* (ative-as!) em português abaixo (são apenas 9 minutos!):

*Os smartphones Android possuem uma limitação que impede de assistir ao vídeo com a legenda. Recomendo que faça o download do aplicativo do TED clicando neste link. Ao abri-lo, digite, no campo de pesquisa, “Judson Brewer”.

Trata-se de um conceito de meditação budista que consiste em passar a ter consciência sobre cada atitude nossa em algum hábito, como o de fumar…

Sair do automático! Sentir cada passo! Não é difícil perceber o quão automatizada se torna nossa vida.

Você presta atenção em cada passo que faz do tomar o café da manhã a pegar as chaves do carro, ir para a garagem, ligar a chave na ignição, usar a marcha e a embreagem (se seu carro for manual), dirigir, ouvir uma música no carro, ACENDER O CIGARRO no caminho do trabalho…?

Essas interessantes técnicas apresentam resultados promissores em estudos científicos. Recomendo que preste atenção (sem trocadilhos!)!

Aplicativos para Smartphone e Computador

Alguns aplicativos ajudam a utilizar a técnica e lhe guiarão no processo de parar de fumar utilizando o método de atenção plena. Como pontos negativos, os apps são em inglês e apresentam planos pagos.

Craving

Aplicativo baseado no programa anti-tabagismo desenvolvido na Universidade de Yale e permite acesso a fóruns moderados pelo próprio Dr. Judson Brewer (do vídeo acima). Utiliza-se do método de atenção plena e fornece vídeos para treinamento diário e outros.

Acesso pelo iPhone/iPad

Acesso pelo Android

Acesso pelo Computador

Headspace

Aplicativo com um melhor design, porém não tem parar de fumar como foco, e sim o método de atenção plena no geral. Apresenta dicas e vídeos que lhe auxiliam no método de atenção plena direcionado a diversas rotinas do dia-a-dia. Também é possível fazê-lo no computador.

Acesso pelo iPhone/iPad

Acesso pelo Android

Acesso pelo Computador

E o tratamento medicamentoso?

Antes de mais nada, o uso de cigarro pode ser associado a outras doenças psiquiátricas, como ansiedade, depressão, déficit de atenção e hiperatividade. É muito importante que o psiquiatra identifique e trate estes transtornos para o sucesso do tratamento da dependência do cigarro.

Você com certeza já ouviu falar de medicamentos, cigarros eletrônicos, chicletes e adesivos de nicotina.

Medicamentos para parar de fumar

Existem duas drogas com ótimos resultados que, essencialmente, competem com a nicotina pelos receptores de nicotina.

Lembra da analogia da chave e da fechadura? Pois então! Imagine duas chaves diferentes competindo pela mesma fechadura.

Os medicamentos (chave que não funciona), de uma forma bem simplificada, competem com a nicotina (chave que funciona) e, apesar de encaixarem na fechadura, não abrem e impedem que a nicotina consiga “abrir a porta”.

Estudos indicam que o uso destes medicamentos podem triplicar o índice de cessação. São indicados para TODOS aqueles que desejam parar de fumar. Não só para aqueles que tentam parar e não conseguem.

Chicletes e adesivos de nicotina

Em associação com os medicamentos, os chicletes e adesivos contendo nicotina são eficientes para diminuir a possibilidade de recaída.

Hoje em dia, recomenda-se a associação do adesivo de nicotina em associação às gomas de nicotina, que devem ser usadas quando sentida a necessidade de fumar.

Esta combinação de adesivo e goma aumenta em três vezes a probabilidade de sucesso, quando comparado ao uso apenas do adesivo.

Cigarros eletrônicos são proibidos no Brasil

Inicialmente promissores para ajudar a parar de fumar, os cigarros eletrônicos foram alvos de estudos contraditórios acerca dos benefícios e prejuízos à saúde. Por este motivo, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), atualmente, proíbe a comercialização destes em nosso país.

Dicas importantíssimas para se ter sucesso e, finalmente, parar de fumar

O psiquiatra ou o terapeuta responsável por auxiliar o tabagista a fumar deverá usar como base do tratamento o aconselhamento e a criação de medidas individualizadas de acordo com as particularidades de cada fumante.

É importante que você reconheça as situações de risco:

  • irritabilidade,
  • tédio,
  • sintomas de abstinência,
  • estresse do ambiente de trabalho,
  • questões sociais, como o uso do álcool “socialmente”.

Com o tratamento, é possível desenvolver habilidades de auto-controle, de modo que ajudem a se preparar para enfrentar essas situações de risco.

Alguns exemplos de situações de risco:

  1. O que fazer se você fuma depois de uma refeição?

Uma boa ideia é, ao terminar uma refeição, comer/tomar alguma coisa cítrica, como um suco de laranja ou a própria fruta e escovar os dentes. A sensação de ter os dentes limpos ajuda a impedir a recaída.

     2. O que fazer se fumo porque estou tenso no trabalho?

Uma boa ideia é dividir o trabalho em pequenas porções, fazer pequenas pausas e desenvolver métodos rápidos e eficientes para lidar com estresse.

Muitos fumantes recaem por falta de informação básica:

  1. É necessário que se ESTABELEÇA METAS! Estipule uma data para parar de fumar!
  2. EVITAR ÁLCOOL! Isso é extremamente importante! Beber álcool dá muita vontade de fumar na imensa maioria dos fumantes. Portanto, é altamente recomendável evitar o uso do álcool durante o período de tratamento.
  3. SINTOMAS DE ABSTINÊNCIA melhoram! A fissura, ou desejo intenso de fumar, normalmente passa rapidamente! Portanto, se você conseguir se segurar neste momento, é provável que não recaia.
  4. O CIGARRO NÃO ACALMA! O que ele faz é acabar com os sintomas de abstinência que ELE mesmo criou.
  5. Não é bom fumar nem uma tragada. 90% dos fumantes dão uma tragada e recaem!
  6. Tabagismo é uma DOENÇA CRÔNICA. As recaídas são frequentes, mas há um processo de aprendizado a cada recaída. Metade dos fumantes que param em definitivo faz quatro ou mais tentativas. Portanto, não desista!

Parar de fumar: a época em que fumar era moda

Vaqueiros, mulheres lindas e famosas, velozes carros de Fórmula 1… E até cigarrinho de chocolate ao leite!!! O impacto da publicidade permitiu um aumento na população de fumantes ao redor do mundo.

Você sabia que, até o início do século XX, pouquíssimas pessoas faziam uso de cigarro? O consumo passou a aumentar a partir da Crise de 1929 e das duas grandes guerras mundiais… A partir destes períodos, houve uma crescente no consumo, que só começou a diminuir em meados dos anos 60, com as descobertas científicas sobre os danos do cigarro e as propagandas contrárias ao seu uso.

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Meu nome é Pedro Henrique. Sou médico formado pela UFES, Psiquiatra clínico formado no Instituto Philippe Pinel, no Rio de Janeiro, e Psiquiatra da Infância e da Adolescência pelo CARIM-IPUB, da UFRJ. Nasci em Vitória e passei a maior parte da minha vida na ilha.

Fiquei apaixonado pela Psiquiatria no primeiro momento em que pisei no ambulatório, ainda na minha graduação. Percebi que não havia especialidade médica com maior capacidade de aproximação do médico ao seu paciente. Até tentei me aproximar de outras áreas, mas não demorei muito a perceber que seria Psiquiatra, profissão que levaria para o resto da minha vida.

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